terça-feira, 16 de setembro de 2008

A PRISÃO DE CAPUXU

Capuxu era um cidadão oriundo das bandas de Sacramento, atual município de Ipanguaçu, mais precisamente da Lagoa de Ponta Grande. Chamava-se Manoel e chegou em Pendência de Cima, ainda garoto, com a mãe viúva, conhecida por Maria da Quixabeira, e mais três irmãos chamados João, Lucília e Severina. João sustentava a família, enquanto viveu pois teve falecimento precoce. Lucília era da congregação Mariana e não perdia os eventos religiosos, nas quatro festas do ano, quando se paramentava com aquele vestido branco e a fita azul no pescoço, para as missas e novenários lá na rua, como era por todos denominada a Pendência de Baixo, na Igreja de São João Batista.
Capuxu, carinhosamente tratado assim por sua mãe que o chamava solenemente de Manué, ganhou o honroso apelido por extensão de um ricaço chamado Manoel Capuxu, senhor de terras e comedor das cabocas lá das bandas do sítio Tira Fogo, nas proximidades de Ponta Grande, em Sacramento como já foi dito. Severina, a mais nova, além de vestir-se e higienizar-se mal, tinha alguns parafusos frouxos e não tinha qualquer habilidade profissional que lhe ensejasse o corriqueiro ganha-pão. Tanto assim que, após o desaparecimento dos familiares, que duraram pouco, e de um acasalamento meio desastrado, o único dos três irmãos, apesar da (ou devido a ?) insanidade, passou a viver da generosidade dos vizinhos.
Não tinham outra referência nem ostentavam talento ou conduta que os elevasse a destaque na comunidade. Os minguados recursos que lhes davam sustentação alimentar não tinham a garantia diária, vez que, não encontrando trabalho braçal avulso permanente, Capuxu, cujas mínimas habilidades aliadas a uma coragem igualmente desalentada, não propiciavam ao nosso herói maiores resultados financeiros. E quando, em algumas noites, não muito raras, ouvíamos aquele vozeirão de Capuxu, entoando canções cujas letras e melodias eram apenas e exclusivas de sua lavra, só conhecidas por ele, a vizinhança comentava.
- Ele hoje não teve o que jantar.
E era visto por quem passasse por aquela choupana coberta de palhas e de paredes meio esburacadas, numa varanda ou alpendre rústico, adaptado em um cômodo da frente da casa, embalando-se em sua rede, a cantar, a todo o volume, aquelas canções – quem sabe? – improvisadas ou ditadas pelo estômago vazio, que de tudo é capaz.
Já lá se ia a década de 40. E não eram muito raras as vezes em que Capuxu não tinha o que jantar. Ocorreu, porém um dia em que ele não teve também o que almoçar e, por conta disso, deu-lhe uma crise de revolta, de valentia, de quase desespero. Num ataque de delírio, deu de mão de um facão e, aos gritos, cortava os ramos dos arbustos existentes em frente a sua casa, pulando e cortando, parecendo um louco. Essa ação estimulou algum dos vizinhos a avisar o Delegado de polícia, que, casualmente, passava nas proximidades, vindo de uma pescaria nas lagoas mais próximas.
A autoridade policial lá da Pendência de Baixo, com jurisdição nas três Pendências, era representada por um soldado conhecido por Macaco-homem. Era um preto feio, magrelo, mau pronto, que, nem todos os sentimentos anti-preconceituosos ou o máximo de toda a boa-vontade do mundo inteiro lhe negava a aparência com o bicho primata que lhe emprestara o apelido. Nunca soubemos o seu nome de batismo.
Como eram poucas as atividades de seu ofício, Macaco-homem era dado a caçadas e a pescarias que, além do lazer, propiciava algum recurso que complementava a receita de seu orçamento e o refrigério de sua mesa. Nesse dia, procedente de uma das pescarias que costumava praticar ali nas proximidades de Pendência de Cima, onde as lagoas e os peixes eram mais abundantes, Macaco-homem, ouvindo aquele barulho desusado, inventou de investigar o que estava acontecendo e o porquê daquela gritaria.
Chegou ao local e viu o valentão aos pulos, de facão na mão, cortando galhos do mato e enfrentando, aos gritos, imaginários inimigos, que o delírio da fome os apresentavam mais agressivos. Como Dom Quixote de la Mancha, o lendário personagem do espanhol Miguel de Cervantes (Século XVI) que enfrentava legiões de adversários, apenas existentes em sua ingênua e delirante imaginação, representados pelos moinhos de vento,
Aproximando-se, e assumindo o pleno exercício da autoridade policial, Macaco-homem, que, embora a sua indumentária mais identificatória de pescador que de autoridade, dirigiu-se a Capuxu e gritou, com veemência:
- Teje preso!
Capuxu, ao receber a voz de prisão, e reconhecendo no pescador a digna autoridade policial, soltou o facão e, num gesto mais rebelde que obsceno, estirou o dedo médio da mão direita e batendo com as costas desta na palma da mão esquerda, disse bem alto:
- Taqui que eu vou!
O delegado, para não ficar desfeiteado e não perder sua autoridade, respondeu, no mesmo tom, com a mesma encenação:
- Taqui que eu levo!
Foi essa a primeira e única ocorrência policial registrada, num período de mais de cinqüenta anos, na existência de Pendência de Cima.
Assim como viveu, Capuxu morreu e foi sepultado, - quem sabe onde? – sem a referência sequer de uma cruz no lugar do sepultamento que também não teve identificação.
Registramos cinqüenta anos sem ocorrência policial, porque, retrocedendo no tempo, colhendo informações aqui, acolá, não tivemos como tresandar para além desse período, que, apesar do Campo de Sangue, registrado por Manoel Rodrigues de Melo, e das assombrações feitas aos filhos pelas mães de Pendência de Baixo, pode ultrapassar muito os cinqüenta anos, que aqui registramos.

A Subserviência da Petrobras

A SUBSERVIÊNCIA DA PETROBRAS

Gilberto Freire de Melo

Há muito que a PETROBRAS deixou de ser uma empresa a serviço do Brasil. É mais uma subsidiária ou subordinada ao cartel internacional das distribuidoras de combustíveis do que uma empresa genuinamente brasileira como a pretendem rotular. Haja vista a submissão ao truste internacional que banca os preços dos combustíveis. Por ser uma empresa de origem eminentemente nacional, que se gaba de haver dado autonomia ao consumo brasileiro, deveria ser a dona exclusiva de seu produto, e não vendendo combustíveis, aos brasileiros, pelo preço do mercado exterior.
É inconcebível que se pague, no Brasil, quase R$3,00 por um litro de gasolina brasileira, se, na Venezuela, a gasolina de lá custa apenas R$0,10. Isso mesmo! DEZ CENTAVOS. Por quê? Quando consumíamos gasolina comprada no exterior, isso nos idos 50 e 60, que cachorro era amarrado com lingüiça, tudo bem. Era errado, mas se admitia.
A mídia está aí a divulgar o surgimento de imensos mananciais de petróleo, nas bacias de Campos, de Santos, da Amazônia, de várias partes do território nacional, porém os preços são ditados pelas bolsas de Nova Iorque. O próprio álcool ou etanol, que não pertence às multinacionais e que é produto exclusivo dos agricultores brasileiros, é subordinado aos preços da subserviente Petrobras . Por quê?
O Brasil atual não exerce autonomia sequer sobre o preço do gás natural que é ditado pela Bolívia. Basta uma greve ou protesto popular dos aborígenes bolivianos para que se altere o preço do gás produzido em Guamaré e Alto do Rodrigues. Como, quando e onde poderemos falar em autonomia? Que autonomia é essa se os preços de nossos produtos, exclusivamente nossos, não são ditados por nós?
Por outro lado, alegam, divulgam, publicam que cartel é uma artimanha criminosa. E, como tal, deve ser punida a sua prática. Como, se as distribuidoras de combustíveis multinacionais seguidas pelas cabisbaixas brasileiras (é bom dizer!) a praticam abertamente, como se não tivessem que obedecer às leis do Brasil? Por que o Ministério Público brasileiro, a Polícia Federal aceitam e até dão cobertura às distribuidoras de gasolina que usam e abusam dessa prática criminosa sem qualquer inibição? Se não dão por que não proíbem, pelos menos as “bandeiras BR”?